GUINÉ: Nô Pintcha

Outubro 16, 2006 às 1:58 pm | Publicado em Comunicação e Sociedade, Política | 3 comentários

Bandeira Nacional da República da Guiné-Bissau - Usa as cores populares da Pan-African da Etiópia.Durante o fim-de-semana, estive em Coimbra, no encontro dos estudantes da Guiné-Bissau. Foi um momento ímpar, onde pude conhecer a Guiné para além daquilo que leio e que vejo nos media. Mas, a verdade é que há um longo caminho a ser percorrido para que o país irmão “desencalhe”. As comunicações apresentadas deram conta de um país que apresenta uma situação social verdadeiramente tenebrosa. Quem quiser trabalhar, tem que ser mesmo por amor à terra porque, o salário, ninguém recebe. É o caso de uma funcionária da Embaixada da Guiné-Bissau, em Lisboa, que, por tanto ouvir reclamações dos alunos, resolveu desabafar: “estou a ver que vocês não têm mesmo a consciência do que é estar a trabalhar na Embaixada da Guiné. Não conseguem perceber que aquilo que consideram como o pior é o melhor que podemos fazer. Eu já estou há 21 meses sem receber um tostão do meu salário. Quem é que terá motivação para dar o seu melhor numa situação dessa? Eu só vou à Embaixada da Guiné-Bissau para resolver o problema dos estudantes porque acho que eles não têm nenhuma culpa do país e do Governo que temos”. Esta situação é sintomática da realidade do país. Relatos tristes, feitos por jovens com vontade de mudar alguma coisa.
Mas, a Guiné não é só o desastre social que os políticos do país nos mostram. A Guiné também tem pessoas muito inteligentes. O problema é que, por serem inteligentes, não vão pegar nas armas para destituírem os que lá estão. Desde a independência, a modalidade de transição dos Governos tem sido através dos Golpes de Estado. Isto é sintomático da falta de uma visão política e social dos que estão à frente do país.
Mas, um dia, a Guiné poderá vencer. Com jovens com a mentalidade daqueles que vi no Fórum, a Guiné não pode ser um país perdido. Tem trinta anos de autonomia falhados. Mas, como nada é eterno neste mundo, haverá uma substituição das gerações de governantes. E espero que esta substituição natural conduza o espírito crítico vivido durante o encontro para a proa do barco.
A situação actual até dá medo. Não estou a dizer isso para desencorajar os meus irmãos. Muito pelo contrário. O futuro da Guiné é um desafio. Um grande desafio… dos jovens. Da nova geração. Dos visionários. A geração revolucionária está “nas tintas”. Não quer saber de nada. O director do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas (INEP) disse que, na procura de apoios para desenvolvimento de trabalhos de pesquisa, um político lhe disse que investigar na Guiné-Bissau é um luxo. Como o painel em debate englobava a “Governação e o Desenvolvimento Local”, perguntei-lhe até que ponto há algum trabalho de fundo que prevê a indexação das estratégias de desenvolvimento do país com as novas tecnologias. Lá estava eu a sonhar com um pensamento muito ocidentalizado, mas fundamental para qualquer economia que queira vencer os desafios da sociedade global, onde o capital e os bons recursos humanos andam sobre rodas. A resposta dele foi sintética: “para pensarmos nas novas tecnologias, deveríamos pensar, antes, na energia eléctrica”. Aí comecei a perceber que a Guiné ainda está longe do sonho do Presidente da Câmara da Praia, que pretende transformar a cidade capital de Cabo Verde na “menina do Atlântico”, cidade tecnológica em que qualquer cidadão leva o seu portátil à praça principal da cidade e conecta logo à “aldeia global”, através da rede sem fios. Um “projectão”, diria eu.
Mas, voltemos à Guiné: O director da INEP ainda disse mais coisas. Disse que o Governo da Guiné não aposta minimamente na valorização dos seus quadros. Ter um Curso Médio-profissional, uma Licenciatura, um Mestrado ou um Doutoramento parece não fazer muita diferença. O salário é o mesmo: 100 euros (isso, quando houver dinheiro). Uma situação muito complicada.
São tantas as coisas que eu não consigo relatá-las todas aqui. Mas, gostei muito. Gostei da atitude dos jovens. Da visão que têm do futuro. Do espírito crítico. Da vontade de vencer. Gostei muito. Da cultura. Da camaradagem. Gostei muito. De ver que a diferença entre NÓS e ELES não é assim tanto. Que temos sonhos iguais. Que sonhamos com um futuro melhor. Gostei muito. De ver que um cabo-verdiano no meio de guineenses sente-se em casa. Gostei muito. De me rever naquela Juventude. Gostei muito. De ver que a Guiné poderá ter um futuro. Ela depende desses jovens… dessas iniciativas… dessas críticas.  
Silvino Lopes Évora

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